(Nas páginas que seguem, transcrevo 3 páginas de meu diário, contando um pouco do que foi a tragédia que assolou Xanxerê no último dia 20.)
Dia 20 de abril de 2015, Xanxerê-SC.
Querido
Diário!
Tudo
começou quando o tempo se armou de um jeito estranho, não do seu jeito de
sempre. Mamãe estranhou, disse que aquilo não era normal. Achou que fosse dar
granizo e como nosso apartamento não tem cobertura na garagem, ficou preocupada
com nosso carro. Mas o dano seria pior do que nosso carro. Papai discordou de
mamãe, dizendo que nem ia chover. Deu coisa pior. Minha mãe estava lendo, mas
com um olho no livro e outro no tempo, indo de minuto em minuto na sacada,
dizendo que não daria coisa boa. Eu também lia, mas ignorava minha mãe,
concordando com meu pai. De repente, papai parou de ler e foi para a janela de
seu quarto, pasmo. Ele me chamou, então eu fui, pois meus olhos estavam
cansados de tanto ler. Juntei-me a ele,
olhando a chuva cair em partes, como se alguém estivesse no céu e jogasse
baldes de água. Cada vez que jogava uma baldada, dava uma pausa para pegar mais
água. Era muito esquisito. Juntamo-nos à mamãe, que estava na sacada havia
algum tempo. Foi então que vimos, no céu, um “tubinho” se formar. Tubinho?
Tubão. Aquele tubo foi crescendo, girando com cada vez mais velocidade. Foi
então que vimos, acredite se quiser, tetos de casa inteirinhos voando, casas
levantando, pedaços de madeira... Minha família nunca tinha visto algo deste
jeito. De repente, falei sem pensar:
__ É um
tornado! É um tornado! Mãe, pai! Vamos para o carro, vamos sair daqui, vamos
fugir!
__ Não,
Bianca- explicou minha mãe-, o tornado levantaria nosso carro fácil, fácil.
__ Muito
obrigado! Mas eu não quero morrer! Quero fazer uma família! Quero viver!
Mamãe
ficou calada. O tornado vinha cada vez mais em nossa direção, para o lado mais central
da cidade. Chegando à metade do caminho, pareceu que o tornado ficou “indeciso”
em relação ao lado que seguiria. Então (ufa!) começou a perder força, como um
lutador de MMA que estivesse parando de socar o oponente (que no caso seria a
cidade).
Depois do susto, fui para meu quarto ler mais um pouco.
Eu precisava de distração, pois escapei da “Dona Morte” de novo. A luz não
tardou a faltar. Depois de um tempinho, mamãe procurou minha vela do batizado e
a cortamos no meio, fazendo duas velas. Ela pingou cera num potinho e “grudou”
a vela lá. Continuamos lendo. O jantar foi “romântico” à luz de velas, dando
impressão de que estávamos em Paris ou outro local chique. (Sempre leio sobre
jantares à luz de velas e dizem que eles são chiques!) Logo fomos dormir.
Dia 21
de abril de 2015, Xanxerê-Sc.
Querido
Diário!
A luz ainda não voltou. Acordei com papai lendo na luz
das velas de meu batizado, então fui ler também. Logo o café da manhã já estava
pronto e minha mãe, brincando, xingou meu pai por não ter feito suco. Mas o
suco verde é feito no liquidificador e estava sem luz, então papai disse que
teria que espremer as verduras, frutas e grãos com a mão. Fomos no exercitar de
carro, na FEMI, mas mamãe quis dar uma passadinha na cidade para ver o que de
fato havia ocorrido, já que até então não tínhamos noção, embora tivéssemos
visto o tornado. Acabamos descobrindo que realmente havia ocorrido um tornado
na cidade e os bairros mais atingidos foram o bairro Taca e o bairro dos
Esportes, segundo minha mãe. Quando vimos os bairros atingidos, NOSSA! Era
cenário de guerra. Aquela parte da cidade estava horrível! Casas no meio da
rua, pavilhões COMPLETAMENTE destruídos, pedaços de madeira para todo lado... E
os fios de eletricidade... Todos embolados uns nos outros, caídos, rachados,
descascados... Postes de luz caídos, quebrados no meio... Era assustador. Moradores
pelas ruas, chorando, assustados, com medo... Com muito medo. Ainda tinha as
pessoas mais curiosas, “olhudas”, tentando ver o que tinha acontecido e os
estragos. Acho que era mais para fofocar, mesmo, Diário, fomos à FEMI e já
voltamos para casa. O dia passou rápido, considerando que fiquei a maior parte
do tempo (de 100% do meu dia, 99,9% foi ocupado) lendo.
Dia 22 de abril de 2015, Xanxerê- SC.
Querido Diário!
Querido Diário!
Como
era de se esperar, a luz ainda não tinha voltado, e, em decorrer da mesma,
estava escuro, a não ser pela vela iluminando a cozinha/sala. Era meu pai e
minha mãe lendo (de novo!). Estávamos apenas com um tiquinho de vela, para ter
uma ideia. Era bom que não usássemos mais de fato precisávamos, pois não sabíamos
até onde ia esta falta de luz. Logo minha mãe e eu levantamos para tomar
café-da-manhã. A minha cama estava tão quentinha... Não queria sair dela.
Mas... Só saio quando minha natureza exigir. Logo que eu acabei meu café, fomos
nos exercitar. Até que este dia estava mais claro que os demais. Logo voltamos
e fui ler novamente. Eu não posso ficar sem ler, mas ler no escurinho? Não é
possível, lamento. O dia passou rápido novamente, a Lua chegando facilmente
para deter o Sol. Estávamos quase dormindo, quando a luz deu uma “piscadela” na
lâmpada. Finalmente, adeus velas! Oi, luz! Seja bem-vinda! Vou ler até cansar
as pálpebras dos olhos!!! Mas foi apenas uma piscadela, mesmo. Logo a luz
tornou a ir embora, como uma rápida visita ao amigo de 3 segundos. Minha mãe,
meu pai e eu esperamos mais um pouquinho na cama, mais ou menos uns dez minutos
quando a luz voltou! Definitivamente, não vivo sem luz. Mamãe foi arrumar a geladeira que, depois
desse tempinho, precisava de um bom trato. Eu, como era de se esperar, fui ler
no meu quarto, até irmos dormir. Foi um bom momento, mas nós ainda tínhamos
casa, comida, roupas, enquanto as pessoas atingidas não tinham nada. Essa foi a
parte mais triste da história. Mas você, leitor (a) de meu blog de textos pode
ajudar doando água, colchão, e também brinquedos...Sim, brinquedos, pois
obviamente há crianças desabrigadas, se nem um brinquedo...
Minha
família doou um colchão, água, roupas minhas que não serviam mais. Meu pai
trabalhou dois dias nos bairros atingidos. Com o pouquinho que podíamos,
contribuímos com as famílias atingidas.
OBS.: O ponto de recolhimento está sendo no parque
Rovilho Bortoluzzi, conhecido como FEMI, em Xanxerê- SC. Para quem não mora em
Xanxerê, pode ligar para o seguinte número: (49) 3441-8500. Este telefone é da
prefeitura municipal e lá poderá se obter mais informações de como fazer para
ajudar as famílias que tanto estão precisando de sua solidariedade.
Sabe aquele móvel ou
utensílio que você não quer mais? Para os moradores desabrigados dos bairros
Taca e dos Esportes terão utilidade.
Minha família, como
disse, já fez a doação. E a sua?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Espere que seu comentário seja moderado para poder vê-lo postado.
Obrigada por compartilhar sua opinião!