terça-feira, dezembro 18, 2018


Declaração Universal dos Direitos Humanos


Oi gente! Como vocês devem saber (e se não sabem, deveriam), no último dia 10 a Declaração Universal dos Direitos Humanos fez seu septuagésimo aniversário! Como eu sempre tinha ouvido falar, mas nunca li a Declaração, resolvi ler numa forma de também conhecer os direitos que todo ser humano tem. Ao ler todos os 30 artigos, ficaram várias dúvidas na minha cabeça e também vários apontamentos de irregularidades que aconteceram e acontecem ferindo tais direitos, e resolvi fazer um texto citandos os 30 artigos juntamente com observações em roxo sobre os mesmos.
Artigo 1
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. Se todos os humanos são iguais em dignidade e direitos, por que, na maioria das vezes, os negros são taxados de inferiores e indignos de oportunidade? Ora, se somos todos iguais, as mulheres deviam receber o mesmo que os homens pelo mesmo trabalho; @ negr@ deveria ter todo o suporte e oportunidade d@ branc@.
Artigo 2
1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. Uau, ainda bem que todos somos tratados com igualdade! *cof cof* O rico nem tem nojo do pobre, o branco nem tem repulsa ao negro, os LGBTQI+ nem sofrem discriminação, os brasileiros nem fizeram uma brincadeira machista com uma russa (que não entendia o português), os direitistas não atacam a torto e a direito os esquerdistas ( e vice-versa)... Ufa, imagina se fosse assim no Brasil???
2. Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania.
Artigo 3
Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Se todos os seres humanos têm direito à vida, por que a vida de uns vale menos que a de outros? E todos aqueles que morreram por motivação política? Mestre Moa, por exemplo...
Artigo 4
Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas. Como todos sabemos, apesar de ser proibida por lei, a escravidão e suas situações análogas ainda continuam em atividade...
Artigo 5
Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Ooi Boçalnaro! Como é mesmo? Ah, você apoia Ustra? Pinochet? Além de rasgar a Constituição (e outros documentos mais), terás também de rasgar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, pois a mesma diz que torturadores desumanos e degradantes como os que você defende não tem vez em um mundo pós-segunda guerra.
Artigo 6
Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei. E aí, Boçalnaro! Deixe-me lembrar... Uma vez você disse, em discurso no Clube Hebraica, que os negros  “não servem pra nada”, “nem pra procriadores  servem mais”, ao referir-se ao peso deles usou o termo “arrobas” e os comparou a ANIMAIS DE CARGA. Cara, ainda bem que tu os reconhece como pessoa, e não como animais.
Artigo 7
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Oiê, Moro! Se todos merecem igual proteção perante a lei, o caso de Lula (assim como, por exemplo, o PSDBista Beto Richa, que foi condenado em segunda instância) deveria ser levado á frente até a última instância possível e não condenado precipitadamente sem provas em primeira instância, como ocorreu.
Artigo 8
Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.
Artigo 9
Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado. Oi de novo, Moro. Tudo bem?
Artigo 10
Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir seus direitos e deveres ou fundamento de qualquer acusação criminal contra ele. Oiiii Morinho! Enquanto tu condenas um precipitadamente em primeira instância, tu perdoas teu amiguinho Onyx Lorenzoni pelo CONFESSADO crime de Caixa 2. Cara, tu é um exemplo de imparcialidade.
Artigo 11
1.Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. Em condenar o futuro presidente do Brasil precipitadamente, tu feres tal artigo, Moro.
2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte de que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.
Artigo 12
Ninguém será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.
Artigo 13
1. Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado. Gente, isso é uma coisa muito pontual aqui de Floripa, mas é piada do mesmo jeito. Aqui, como forma de “desafogar o trânsito”, os caras da prefeitura e de uma empresa privada do Rio (acho) fizeram uma parceria público-privada e colocaram em alguns pontos da cidade uns patinetes elétricos. Detalhe: tem que pagar 0,50 centavos por minuto (mais caro que um ônibus) andado e tem que baixar num aplicativo para poder usar. Problemas: é caro, uma pessoa idosa não consegue andar nisso, e nem todo mundo tem celular (eu, por exemplo, não tenho). Mais uma vez o mercado atingiu os consumidores de inutilidades sem resolver o problema do qual tão ansiosamente se espera solução. Essa tática de desafogar o trânsito se mostra muito acessível para todos!
2. Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio e a esse regressar.
Artigo 14
1. Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países.
2. Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.
Artigo 15
1. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade.
2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.
Artigo 16
1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução. Homens e mulheres de maior idade têm o direito de fundar uma família. Isso é, família de homem e mulher, mulher e mulher e homem e homem, com iguais direitos de relação (pena que isso não funciona). E outra: numa relação onde, em 99% dos casos, a mulher é submissa e desfavorecida, em caso de dissolução do matrimônio, o homem ficará com a maior parte dos bens.
2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes. 
Quantas mulheres que casam por pressão familiar e social...
3. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado.
Direito à PROTEÇÃO, não de OPRESSÃO.
Artigo 17
1. Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.
2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.
Artigo 18
Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto em público ou em particular. Já tive amigas que se afastaram de mim devido à minha família ser ateia. Eu tenho direito de ser quem eu quiser, pensar o que eu quiser e crer no que eu quiser!
Artigo 19
Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras. Ainda hoje jornalista são presos e mortos devido ao lado que representam e às opiniões que expressam...
Artigo 20
1. Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. Acho que esse é o mais respeitado. As reuniões e manifestos pacíficos de esquerda nunca são alvo de bombas de gás nem nada. Aham.
2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.
Artigo 21
1. Todo ser humano tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.
2. Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. 
É, porque o serviço público realmente é para todos, e nunca ocorre nenhum tipo de violência enquanto se presta tal serviço.
3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; essa vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.
Artigo 22
Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.
Artigo 23
1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. Num país cujo desemprego atinge 12,7 milhões de pessoas e cujo futuro presidente diz que os trabalhadores terão que optar entre ter trabalho (sem direitos) e ter direitos (sem trabalho), acho que proteção contra o desemprego e condições justas e favoráveis de trabalho, que é um direito humano, não se encaixa aqui, não é mesmo?
2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.
As mulheres, exercendo o mesmo trabalho numa sociedade predominantemente machista e patriarcal, recebem menos que o homem. E isso se estende até outras barreiras, como o branco ganhar mais que o negro e o homem hétero ganhar mais que o homossexual por questões de preconceito.
3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
Creio que uma remuneração justa não seja 44,5 milhões de brasileiros receberam em média R$ 747 por mês enquanto os 1% mais ricos ganham 36 vezes mais do que a metade dos trabalhadores recebe em média. Isso é um exemplo do quão dignamente a maioria dos brasileiros vivem, em comparação com os mais endinheirados. E a proteção social (como escolas públicas de qualidade, saúde pública de qualidade, segurança pública de qualidade etc...)  não foi congelado por 20 ano pelo nosso querido e atual presidente Michel Temer? E o Bolsa Família não está sendo ameaçado pelo Boçalnaro, com a desculpa de que o PT “quebrou o Brasil” e que a melhor maneira de arranjar recursos para atender às demandas das despesas do Brasil é cortando esses meios de ajuda aos mais necessitados?
4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.
Artigo 24
Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.
Artigo 25
1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. Comentei sobre no Artigo 23.
2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.
Não ocorre violência obstétrica durante o parto. A infância não é influenciada pela sociedade, que está podre. Ufa, ainda bem.
Artigo 26
1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. Bem, não preciso nem dizer que a qualidade da instrução gratuita é bem inferior à da instrução privada: isso é para que pensemos que o privado é bom e que o público é ruim. Sendo assim, privatizar tudo seria bem melhor, não? Além disso, é necessário investimento na educação para que sua qualidade aumente (e não diminua), o que não acontecerá devido ao corte de gastos do atual governo (que congelou investimentos como esse por 20 anos).
2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
Instrução pela liberdade? Compreensão, tolerância e outras coisas mais? Num lugar onde o senso comum, incompreensão e intolerância com o diferente imperam, seria isso possível?
3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.
Artigo 27
1. Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios.
2. Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica literária ou artística da qual seja autor.
Artigo 28
Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados. Tá difícil...
Artigo 29
1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.
2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.
3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas.
Artigo 30
Nenhuma disposição da presente Declaração poder ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.
Gente, só lembrando que DIREITOS HUMANOS são para TODOS os humanos, não apenas para HUMANOS DIREITOS como o futuro e boçal presidente alega. São direitos para direitos e esquerdos, homens e mulheres, negros e brancos, ricos e pobres. São direitos para todos. Mas levando em conta o quase analfabetismo do nosso futuro presidente e o pouco tempo (26 anos) que ele teve para ler um livro (a Constituição) e 30 artigos (acima), é querer demais que ele os conheça, e mais ainda, que os respeite. Não podemos depender dele para defender o povo. Nada representa melhor o povo do que ele mesmo, e ninguém mais poderoso para barrar a subida de um idiota ao poder do que quem o elegeu. Juntos, povo, devemos fazer as mudanças que queremos com nossas próprias mãos, com as ferramentas que temos. A minha ferramenta é a escrita, a voz, o desenho, a arte. Cada um tem a sua maneira de resistência, e eu sonho com o dia em que todos comecem a utilizar a que tem.

terça-feira, dezembro 11, 2018



América Armada
Oi gente! Voltei para retomar o bloguinho, que (convenhamos) estava atirado às traças... Volto após muitos acontecimentos: eleição do BOÇALnaro, saída dos médicos e heróis cubanos do Brasil, escândalo do Carrefour após morte arbitrária de uma cachorrinha (essa situação assemelha-se muito a que, penso eu, viveremos sob a ditadura do Boçal. A diferença é que não matarão cadelas, matarão nossos companheiros humanos). Enfim, após muitos acontecimentos (que eu pretendo retomar), volto eu para contar-lhes sobre um filme que assisti nesses últimos finais de semana: América Armada.
O documentário, exibido no CIC (Centro Integrado de Cultura) e parte das exibições do Planeta Doc, conta a (triste e violenta) realidade de três pessoas em três países da América: Brasil, México e Colômbia. O que elas têm em comum? Dor, sofrimento, saudade, resistência e, principalmente, intervenção (maléfica) de milícias e do crime organizado em suas vidas.
A perspectiva brasileira ocorre em uma zona periférica do Rio de Janeiro; um jornalista autônomo registra policias sem farda invadindo barracos sem nenhuma explicação, dizendo tolamente que “estavam cumprindo ordens”. O jornalista, fazendo seu trabalho de enfrentamento e de resistência, recebia ameaças de morte do tipo “vou escrever o seu nome em uma bala perdida” e todo tipo de intimidação possível. Segundo uma fala do corajoso, os policiais invadiam a favela com o argumento de estarem batalhando contra as drogas, mas esse argumento é falho; quer dizer que as drogas estão somente na favela? Não estão inseridas nos círculos mais endinheirados da população? Por que não é feito uma “batalha contra as drogas” de maneira truculenta com e entre os ricos? Isso prova que a batalha dos PMs envolvidos na intervenção militar no Rio não é contra os narcóticos. É contra a população mais pobre, mais vulnerável e mais desamparada.
A parte do documentário que se passa no México é (também) com um jornalista que visita um povoado no qual a disputa territorial é acirrada (não fica claro no filme quais são os envolvidos nessa disputa... serão os grandes latifundiários? Os plantadores de Coca? Os EUA?) e, cansados de verem companheiros/as e parentes morrerem pelas mãos de milícias (mais de um quinto da população foi dizimada nesse processo), os/as habitantes do povoado resolvem eles/as mesmos/as fazerem justiça. Pegaram em armas com peso na consciência, peso daquela que não sabe o que ocorreu com o marido, daquela que não pode dizer ao filho como o pai tinha morrido antes do mesmo ter um destino parecido. O jornalista que narra essa realidade diz que a morte de companheiros que exercem a mesma função que ele é enorme (por causa do local ser alvo do tráfico internacional de drogas, assim como na Colômbia) e que se sua vida for o preço para expor a realidade, é um preço que ele está disposto a (mas não precisaria) pagar.
Já na Colômbia, eu me emocionei muito... Conta sobre a luta de uma mulher, já idosa, na procura de seu filho que “desapareceu” nas mãos do tráfico, em chacinas encomendadas pela própria chanceler do estado. Em seu relato, a senhora disse que, quando ia denunciar o desaparecimento, não era possível dizer o nome do agressor, pois o relator já ligava para o indivíduo e dizia “Ó, fulana tá aqui te denunciando porque cê matou o filho dela, viu”. Essa mulher lidera muitas outras que perderam alguém querido para o tráfico: marido, filh@, familiares, amigos. O que mais me emocionou foi uma cantiga que essas mulheres, em protesto, cantaram em frente a uma igreja. A música falava que, apesar do tempo ter passado e da ferida ser antiga, as mães sempre estarão esperando seus filhos com as portas abertas. E mesmo que esse dia não chegue, elas mantêm a esperança e o amor que apenas uma mãe pode sentir pelo seu filho... E vi como isso se aplica à minha família também... Que minha mãe nunca desistiria de mim, independente de saber se eu voltaria ou não...
Enfim, pode-se tirar várias conclusões e várias perguntas desse filme. Exemplificando as truculentas ações da polícia no Rio, temos a intervenção militar, que ao invés de diminuir mortes, tiros e drogas (como o prometido) aumentaram as mesmas. Após 10 meses de intervenção, o que tivemos? Atos violentos com ao menos 3 mortos subiram mais de 86%; o número de armas apreendidas diminuiu 36,5%; mais de 4 mil tiroteios (de acordo com esse site  https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2018/07/16/com-intervencao-ocorrencias-com-mais-de-3-mortes-no-rio-sobem-e-apreensoes-de-armas-caem-diz-estudo.htm) . Vejam que bons resultados! E os moradores de periferia, apesar desse cenário crítico, continuam resistindo com música, com poesia, com enfrentamento. Que faremos perante o que vem aí? Seremos capazes de combater Mirapólvora com Miraflores?
Quanto ao México... Bem, não gostei muito dessa parte. Sabe por quê? Porque “legitima” o uso de armas, já que os moradores, buscando fazer justiça com as próprias mãos, pegam nas mesmas... E será essa a solução, Boçalnaro? Fazer isso só aumentou a violência, as mortes (tanto de um lado como de outro). Como vocês, da direita, gostam MUITO de falar em “copiar modelos” para o Brasil, copie e cole esse! Liberou armas? Mais violência. Mais morte. Mais caos. O número de mortes, principalmente de mulheres, negr@s e pobres vai subir, e MUITO... Legitima-se a causa e nega-se as consequências, como vocês muito têm feito, fechando os olhos para coisas tão óbvias que chega a ser tosco.
Achei corajoso e inspirador, também, os jornalistas autônomos que realizaram as filmagens sem medo. Sem medo da repressão, sem medo do porrete, sem medo da bala, sem medo da mordaça. Acho que devemos levar isso como lição de vida: apesar das dificuldades que a vida nos impõe, é preciso enfrentá-la. Dizer não à mão que tapa nossa boca, nos impedindo de falar e gritar o que sentimos; dizer não à mão que fecha nossos ouvidos, nos privando dos sons e do exterior; dizer não à mão que insistentemente tapa nossos olhos com firmeza, para nos deixar cegos, com medo, resignados e submissos. Dizer não, enfim, a esse governo de merda que, mesmo ainda não tendo tomado posse, já causou tantas mortes e tantos estragos. É isso que precisamos para a vida. Resistir até o último suspiro.

domingo, agosto 05, 2018

Um breve resumo...

Resumo de um livro que se assemelha muito à nossa realidade
                                                                                                  
Lido por indicação de minha mãe nas aulas de leitura, o livro 1984, de Eric Arthur Blair (vulgo George Orwell) não me agradou no começo, encantou-me no decorrer da história e desgostou-me ao fim. Por ser um clássico literário da ficção científica, o livro deixou a desejar; ao mesmo tempo, deixou muitas reflexões e comparações com a situação política e demais acontecimentos do nosso país.
O livro, publicado em 1949, conta sobre um futuro no qual o Estado sabe de tudo: todos são vigiados 24h por dia, 365 dias por ano, por um aparelho (lembrou-me as televisões, celulares e etc...) chamado teletela; a língua é empobrecida para que não ocorram pensamentos-crime (censura da linguagem para que revoltas e revoluções sejam coibidas quando estiverem sendo pensadas e faladas); as pessoas são “vaporizadas” (desaparecem, após o Estado as torturar, fazerem confessar mesmo que não tenham culpa; desaparecem não só fisicamente, mas elas somem de todo o tipo de registro – fotos, textos, gravações- que as envolva) e há também uma construção e modificação constante da verdade.
O personagem principal, Winston Smith, trabalha para o Estado e, em sua mente, para o “Grande Irmão” (praticamente a personificação das coisas boas, como obediência e demais valores que foram invertidos para servir àquela ocasião) no Ministério da Verdade. O que Winston faz? Ele recebe relatórios em novafala (lembra do empobrecimento da linguagem? É chamada de novafala)  dizendo que tais pessoas foram vaporizadas, que a Oceânia (local onde a história se passa) mudou de oponente e aliado... E era encarregado de trocar as informações que o Partido não queria e substituir por outras que o Partido determinava. Como Winston disse, em um trecho do livro, ele estava “reconstruindo constantemente o passado e tecendo o futuro”.
Winston não era conformado com tanta doutrina: ele queria saber o que se passou antes dos documentos históricos serem modificados. Por isso, com todo o cuidado do mundo (pois já suspeitava que estivesse sendo seguido por uma mulher que ele julgava ser da Polícia de Ideias), procurou pelas periferias alguma coisa que pudesse lhe dizer o que era antes de ser o que é. Encontrou um antiquário, e ao sair do mesmo (tendo comprado apenas um coral proveniente do Mar Índico), deparou-se com a mulher que o seguia e precisou resistir ao ímpeto de arremessar um tijolo contra sua cabeça, tal sua indignação contra a suposta participação da mulher na Polícia de Ideias. Não o fez, e voltou para o trabalho.
Ao voltar para o trabalho e participar dos Dois Minutos de Ódio (dois minutos nos quais o esquerdismo e liberdade de expressão e seus representantes eram intensamente odiados), encontrou-se com a mulher que o seguia, que deixou um bilhete na mão de Winston. Seu conteúdo nada condizia com o que Winston havia suposto: dizia apenas I love you. Winston tentou aproximar-se, sob diferentes contextos, daquela mulher. Dela, arrancou apenas alguns conselhos para um encontro longe das teletelas e do Grande Irmão.
Naquele encontro, no meio de uma floresta, conversaram sobre as possibilidades de revolução; amaram-se; conheceram-se; e combinaram repetir a dose. Após muitos encontros como esse, ambos filiaram-se num suposto “esquerdismo”, que não passava de uma armadilha do próprio Governo para prender, torturar e matar aqueles que procurassem o demoníaco esquerdismo e a temida liberdade.
Com Winston e Júlia não foi diferente: a Polícia das Ideias os surpreendeu falando sobre revolução, separou-os (a partir daí o texto foca em Winston), tortura Winton, aplica ainda mais ideologias como “se-o-Partido-quer-que-dois-e-dois-sejam-cinco-então-dois-e-dois-serão-cinco”, faz com que Winston traia Júlia e, por fim, mata-o. O mesmo morre feliz, pois enfim acreditou que dois e dois são cinco; em suma, Winton morre amando o Grande Irmão.

quinta-feira, março 22, 2018


Vivenciando a violência de gênero

Já faz tempo que eu leio o blog da Lola. Leio o tempo inteiro sobre machistas, reaças, casos de desrespeito, estupro e relatos de outras mulheres sobre o assunto. Porém, ler é uma coisa. Sentir na pele é outra. Isso é bom e ruim; bom porque sei que é realidade, que coisas assim acontecem nessa, em escalas mais leves e mais pesadas. Ruim porque é, infelizmente, realidade, e precisamos conviver com ela mesmo não concordando. Mas afinal, o que aconteceu?
Ontem, como sempre, ao fim da tarde, eu e minha mãe fomos nos exercitar na Beira-mar Norte: caminharmos, conversarmos e jogarmos frescobol. Costumamos caminhar do único trapiche da Beira-mar até a Direto do Campo (ou mais, se nos der vontade); conversamos sobre tudo, menos sobre qualquer coisa; e eu simplesmente adoro jogar frescobol numas quadras de areia que a prefeitura construiu. Saímos ontem com o intuito de fazer as três coisas, mas com foco no jogo.
Fomos nas quadras (torcendo para que alguma estivesse vaga), porém, torcer não adiantou. Estavam ocupadas, mas em uma ainda não havia ninguém jogando: estavam apenas ocupando o espaço. Pedimos com educação se poderíamos ocupar metade da quadra para os jogadores bombados do futevôlei. Tudo bem, poderíamos ocupar metade da quadra. Mas sabe aquele tipo de pessoa que te dá permissão para fazer tal coisa e não dá as condições? Jogamos um pouquinho e, assim que mais um jogador chegou, eles foram nos empurrando cada vez mais para o cantinho da quadra. Percebemos que queriam a quadra inteira, não só metade, e como eles já estavam antes... Mamãe me coagiu a ceder o espaço, e a contragosto, fomos jogar na quadra de areia perto da Direto do Campo. Até aí tudo bem. Saí contrariada pois não achei que deveria sair, uma vez que tinha permissão para jogar na metade da quadra. Mas a boa educação é uma coisa, não? Saímos de boas.
Hoje, quando saímos novamente (e torcendo mais uma vez para que as quadras estivessem vagas), tivemos sorte. Em uma das três quadras tinha alguém ocupando para um provável jogo futuro. Na outra, jogadores de beach tennis. E uma... Ufa! Vaga. Jogamos, cortamos, buscamos a bolinha, divertimo-nos. Passou-se um tempinho assim, na felicidade, curtindo o esporte e a companhia uma da outra (mãe, te amo viu?). Mas a alegria dura pouco... Logo, os bombadões chegam de novo, e por uns cinco minutos se contentaram em jogar na metade que não estávamos ocupando. Passado os cinco minutos, eles simplesmente invadiram a nossa metade da quadra, dizendo pra gente sair, que naquela quadra era preferencialmente (eles não sabem o que significa preferencialmente, só pode!) de futevôlei, que deveríamos ir na de beach tennis, que nem tinha quadra pro que a gente jogava... Olha, que desrespeito viu?!
Minha mãe tentou explicar que não era burra: entendia o que eles queriam dizer, e argumentou que, como sendo construção da prefeitura, era obrigatoriamente espaço PÚBLICO, para todas as pessoas, para todas as modalidades, pra negro, pra branco, pra rico e pra pobre. Mas discutir com HOMENS BOMBADÕES ALIENADOS E MIMADOS não dá, não? Para não arrumar encrenca, saímos do nosso lugar e pedimos EDUCADAMENTE para ocuparmos outra metade da quadra, enquanto o jogo de vôlei não iniciava. E para sairmos, não precisou de ninguém para nos expulsar.
Voltamos para casa com o sangue á cabeça. Sabe por que aqueles trouxas fizeram aquilo? Porque somos MULHERES e porque foram mimados desde que saíram da barriga da mamãe. Afinal, onde já se viu duas mulheres ocuparem um espaço reservado apenas para machões que acham que músculo compensa a falta de cérebro e que o principal componente da vida deles é o que tem no meio das pernas? Faça-me o favor!
Lola, obrigado por me preparar para sentir raiva. Mãe, obrigado por continuar me dando bons exemplos e não desista sem lutar. Bombadões, obrigada por fazerem o que fizeram: assim, provam que são machistas, idiotas e preconceituosos, além de darem impulso para o que eu escrevi com muita raiva. Eu não vou aceitar isso dessa maneira, e quero que saibam que não fui feita para seguir ordens, muito menos de vocês. Talvez isso renda um bom enredo de outro livro (depois do Formigas), embora eu não goste de escrever sobre coisas que me enraivecem e entristecem. Mas é a vida, e precisamos estar armados para sobreviver à ela.



sábado, janeiro 27, 2018

Um chinelo especial

O que pode ser especial para você? Alguma roupa, algum objeto, alguma pessoa importante? Pois para mim especial é tudo aquilo que me faz feliz, que me faz sorrir, que me faz pensar, não necessariamente nessa ordem. Incrivelmente, hoje me dei conta de que tenho muitas coisas assim, e não só objetos! Minha mãe, meu pai, amigos... E um chinelo. Exato, um chinelo! Que já tem toda uma história aqui em casa...
Encontramo-lo na calçada da rua do nosso prédio, enquanto ainda estávamos em Xanxerê, quando voltávamos de uma rotineira caminhada pela estrada da vida. Estava sem tiras, sujinho e um pouco gasto, mas como minha mãe precisava de um chinelo e como meu pai é econômico... Resolvemos recolhê-lo. Colocamos tiras, limpamos e tcharam! Minha mãe ganhou um chinelo, que já está aguentando por três anos as caminhadas que fazemos para fugir um pouco de tudo isso que está acontecendo no país e no mundo.
Hoje pela manhã fomos dar uma escapulida de casa para ver uma calça para mim, e costumeiramente minha mãe e eu fomos de chinelo (o pai não foi na caminhada). Como o meu chinelo (cheio de voltas, florezinhas e tudo o mais que serve apenas para machucar o pé) estava incomodando, resolvi trocar com o da mãe (simples, prático e confortável chinelo achado na rua).
Voltando para o prédio, subimos, como de costume, pela escada. E o chinelo, cheio de consertos e remendos, me deu um grande susto! Como a tira estava escapulindo, meu pai arrumou um pedaço de borracha embaixo dele, o que o impedia de escapar cada vez que a mãe trocava de passada, e esse pedaço de borracha também fixava o chinelo no chão (impedindo alguns tombos), e quando fui puxar o pé para subir mais um degrau... PLOP! O “dispositivo de segurança” foi acionado, me dando um belo susto e me fazendo rir.
Depois mais, pensei realmente que o chinelo era especial. Foi achado no lixo: poderia ter sido pego por outra pessoa antes de nós, poderia ter parado num lixão, poderia ter ido ao aterro sanitário. Poderia ter sido jogado lá por uma madame que usou duas vezes e enjoou, poderia ter sido jogado por um morador de rua, poderia ter caído do caminhão das Havaianas. Aliás, uma coisa que acontece muito aqui na beira-mar: consumo exacerbado.
Quando passamos pela lixeira do prédio ao lado (sempre fechada para evitar que moradores de rua, ou a pária da sociedade na opinião deles, durma lá), vemos caixas e caixas de vidros do mais caro vinho (brincamos: esse pessoal toma vinho ao invés de água?), sacos e sacos de roupas boa e nova (“Hmm, usei só uma vez, mas já enjoei, já saiu de moda, tá cafona, e por falar nisso, abriu uma nova loja no shopping que tem uma blusinha que é um mimo e...”) e geralmente um móvel que parece recém saído da loja (“Não gostei muito do tamanho do pé esquerdo desse rack, vou mandar fazer um sob medida, esse eu coloco no lixo porque não gosto e não porque tá quebrado”).
Gente, achamos um chinelo no lixo!, demos utilidade para ele, estamos reparando cada probleminha que acontece com tudo aqui em casa (carro, roupa, etc) e não jogando fora! Aquela borrachinha na sola do chinelo me fez ser feliz por um momento, me fez rir, me fez pensar.
 É notável que, comprando uma blusinha nova ou encomendando um rack sob medida, á longo prazo, você não vai ser feliz! É apenas uma compra, uma euforia, um desejo momentâneo! Como minha mãe disse á muito tempo (mas que vivo lembrando para mim e para os outros), come uma cenoura que passa. Não é realmente necessário ter o carro do ano. Nem a blusinha da moda. Porque, apesar das ilusões que os outros impõem para você e as ilusões que são impostas de tu para ti mesmo, aquilo não traz felicidade. Traz consumismo, alienação e lixo.
Enfim, o chinelo achado no lixo me fez feliz. Fez-me pensar. Fez-me sorrir. Uma coisa tão simples dessa rendeu tudo isso que acabastes de ler. Afinal, as coisas que realmente nos trazem felicidade na vida são as mais simples. Tens certeza que o chinelo não é, realmente... Especial?

segunda-feira, janeiro 22, 2018

Cenas do cotidiano VI

Uma tartaruga no meu laguinho?

Há quatro dias frequentamos
O mesmo laguinho nas dunas
E certamente já nos apegamos
Àquelas boas horas oportunas

No quarto dia, não se espante!
Tivemos uma grande surpresa
Já havia um novo ocupante
Na nossa pequena represa

Já havia cavado buraco
Estava tranquila nadando
Eu quis armar um barraco
Mas sem á tartaruga causar dano

Eu fiquei muito chateada
Por não poder mais lá nadar
Já estava bem mais habituada
Outro lugar teria que procurar

Penso como aconteceu
Como ela parou no lago?
Junto com as chuvas desceu
E logo achou aquele lugar vago?

Ou alguém que já não estima
Resolveu a tartaruga lá largar
Animal suscetível ao clima
Resolveu naquela lagoa se refrescar

Mas não só com tartarugas acontece
Com outros animais também
Que é um ser vivo, o homem esquece
E o animal fica sem ninguém

No dia seguinte ligamos
Para o projeto Tamar
Eles disseram: “vamos”
“vamos aquele bicho salvar”

Hoje, visitaremos com apreço
O projeto Tamar
Se vir uma tartaruga, lhe peço

Deixe a tartaruga nadar!

terça-feira, janeiro 16, 2018

Aparados da Serra

Minha viagem nas (merecidas) férias: Aparados da Serra!

Já estávamos ensaiando muito tempo uma viagem: não a trabalho, não por obrigação. Uma viagem prazerosa, enfim, depois de tantas “obrigatórias”. Sonhamos primeiro ir para o Peru, mais especificamente conhecer Macchu Picchu; depois, desejamos a Chapada dos Veadeiros, em Goiás; depois, a Serra da Bodoquena, em Bonito. Por fim, decidimo-nos por um destino mais próximo, mais acessível e com a possibilidade do percurso ser feito em menos tempo e tornando, portanto, a estadia mais longa. Sim! Nosso destino foi os Aparados da Serra, em Cambará do Sul-RS.
Resolvemos sair de casa com dois motivos principais: aproveitar as férias e fugir da infestação de baratas aqui do condomínio (olha só que condomínio legal! Além de não poder brincar com outras pessoas, não poder fazer quase nada- como escrevi em http://blogdetextosdabia.blogspot.com.br/search?q=Um+condom%C3%ADnio+esquisito -, o aluguel é uma facada e está cheio de baratas! Uhu!). Uma dedetização foi realizada no dia 8/01, e fizemos nossa própria dedetização em casa, com o fumigante da Jimo (super eficiente, recomendo), portanto, saímos de casa meio que correndo para não respirarmos aquele fumacê.
Primeiro passo: arrumar as malas! Levamos em consideração que (por nossa longa experiência no RS) as estações são sempre extremas. O calor é de desmaiar, o frio de congelar. Como meu pai diz “calor de desmaiar batista” e “frio de renguear cusco”! Como estamos no verão, levamos apenas roupas de verão: shorts, blusinhas, chinelos de dedo... E nenhum casaco. Grave isso, será útil lá na frente.
Saímos de casa dia 6/01 e voltamos dia 11/01, ou seja, ontem á noite. Bem, saímos bem cedinho: a primeira parada seria em Anitápolis, para conhecermos o lugar melhor. Chegando lá (depois de, no máximo, três horinhas de carro), fomos descobrir melhor os 70 hectares da fazenda onde nos hospedamos (Pousada Recanto das Cachoeiras, tudo muito simples e aconchegante, porém, com cafés e demais refeições pobres e pouco variadas). Ficamos por dois dias fazenda carinho em coelhos, comendo mel do favo, percorrendo duas das 10 cachoeiras da propriedade e passando muito, MUITO frio. E o casaquinho que é bom? Nada... Mas deu para sobreviver.
Saímos de Anitápolis, passando por Braço do Norte, São Ludgero, Orleans, Bom Jardim da Serra, São José dos Ausentes e, aleluia, chegamos a Cambará do Sul. Ah, mas não foi assim, simplesmente! Escolhemos esse trajeto para passarmos pela Serra do Rio do Rastro, uma das estradas mais perigosamente belas de SC. Bem, quanto ao “belo”... Ficou só na imaginação. Adivinha o que vimos? Uma bela de uma viração! Beeeeem branquinha, tapando totalmente a visão bela que teríamos em outra ocasião. Nessa altura, já estava muito frio (claro, a chuva e o vento contribuíram muito...), e o casaquinho? Nada.
Uma parada para comer num restaurante amigável, com moedas estrangeiras em quadros distribuídos pela parede (meu lado apaixonado pela numismática pirou!). Depois, MUITA estrada de chão... Alguns comentários na internet dizem: “ah, estrada muito ruim, vão apenas de 4x4”. Cara, besteira. Nós estávamos com um Gol bolinha de 2004, mais velho que eu, e passamos por toda a estrada sem nenhum problema (enquanto uns Audis, Harley-Davidsons e Fords estavam fumegando no acostamento da estrada).
Eu dormi por uma boa parte do trajeto, acordei com a voz de duas pessoas: ambos fornecendo informações para meus pais. Logo, paramos num posto de gasolina (gasolina caríssima, sou do tempo em que a gasolina custava dois e pouco) e seguimos até São José dos Ausentes. Um resumo da cidade? Pense em uma rua. Pense em meia dúzia de casas. Pense que as 6 casas nessa rua estão caindo aos pedaços. Pense que, nessas 6 casas nessa rua que estão caindo aos pedaços não tem nenhuma alma viva (quem dirá morta!). Pense que realmente existem as 6 casas nessa rua que estão caindo aos pedaços sem uma alma viva, só que a cerração é tão fechada que não conseguimos ver absolutamente nada!
Caráter educativo da viagem: agora tenho em mente o que realmente é um latifúndio! Queridxs estudantes leitorxs do meu blog: um latifúndio é uma porção de terra gigante, que tu anda, anda e anda e não acaba mais; nessa terra gigante, pode crer que não vais encontrar ninguém além dos peões de fazenda; e nessa terra grandíssima só encontrará gado, uma vegetação muito rasteira e taipa. Taca-le taipa nesse latifúndio velho! Taca-le taipa! (Taipa, para quem não sabe, é um muro feito de pedras empilhadas por, provavelmente, escravos que receberam esse castigo monótono).
Achei curioso também o nome das fazendas: Fulando de Tal, Beltrano de Tar, Cicrano de Tac... Só nomes imponentes e masculinos. Será que não tem mulher nessas fazendas não? É como eu estava lendo no livro “Os Homens Explicam Tudo Para Mim”, de Rebecca Solnit em um dos trechos: “Pelo casamento, o marido e a esposa constituem uma só pessoa perante a lei: isto é, o próprio ser ou a existência legal da mulher fica suspenso durante o casamento, ou, pelo menos, é incorporada e consolidada no do marido; sob cuja asa, proteção e cobertura, ela executa tudo [...]”. Creio que, em casas em que os números 16, 15 e 14 estejam grudados em cada vidro (números eleitorais, ainda da época de campanha de certos porcos) seja assim. Aliás, brinquei com minha mãe que retrocedíamos no tempo a cada vez que a numeração baixava: século XVI, século XV, século XIV.
Chegamos ao chalé da Pousada Brisa dos Canyons, comemos e descansamos. Tive que dormir num beliche (na parte de baixo), e meu conselho é que, se tiveres opção, durma na parte de cima. No dia seguinte, fomos ao cânyon Fortaleza, mas não chegamos a fazer as trilhas para ver os paredões. A chuva e a neblina eram tantas que não se via um palmo na frente do nariz. Fomos, então, para um canyon mais “fofinho”: o do Itambezinho, com trilhas demarcadas, gente pra caramba (apesar de ser “baixa temporada” no verão) e MUITA neblina. É necessário muita persistência para poder se enxergar uma pontinha de nada de um abismo incrível...
Única reclamação: as estradas e os acessos para os tais cânyons. O turismo para os cânyons, conforme visto nessa viagem, acontece o ano inteiro, em todas as estações! Não é necessário um “reparo” nos cânyons, eles sempre estarão lá! Não é como aqui em Floripa, que sempre que a maré sobe a prefeitura faz os devidos (ou deixa de fazer) reparos nas praias, fazer as barreiras de contenção, os banheiros (pagos, e só tem banheiro em algumas praias do Norte e na Joaquina) etc. Lá não! Não precisam “aumentar” ou “diminuir” um cânyon, e levando em conta que eles pedem “doações espontâneas” toda vez que alguém passa pela guarita para entrar no parque, os acessos deveriam NO MÍNIMO serem asfaltados e muito bem sinalizados.
Nesse mesmo dia, paramos no Aparados da Serra Park, atraídos pelos passeios à cavalo que eu estava a muito tempo a fim de fazer. Lá, conversamos com a simpática Carol (praticamenteverde@gmail.com para mais contatos, vale realmente a pena conversar com alguém tão simpático como ela) e fizemos um passeio a cavalo de 1hr. Andei na égua Anna (meu pai costuma dizer que não gosta muito de cavalos porque possuem aquele “acessório” extra) e vi a cidade de cima. Não é exatamente uma visão de Florianópolis, mas as cidades pequenas tem o seu charme...
Voltamos novamente ao cânyon Fortaleza, dessa vez abaixo de chuva (compramos as capas). Surpresa! O Fortaleza estava completamente limpo! Sem nenhuma neblina! Vimos o rio serpenteando lá embaixo, vimos a vegetação crescendo sob a pedra, vimos aquele perau de mais de 900m de altura! Em determinada parte, meu pai disse: “parece que ele nos atrai para baixo”... É a gravidade, não? Mas grave mesmo seria se alguém caísse dali... Enfim, não há palavras para descrever como é estar perante um cânyon, perante uma força contra qual é inútil lutar. Se falar para alguém “Ah, eu vi um cânyon de quase 1km de altura, vi vegetação na pedra e tinha tanta neblina que tapava completamente esse cânyon de 1km”. Me diz, QUEM vai acreditar nisso? Isso é uma daquelas coisas que só vendo para crer mesmo...



Nossa estadia nesse lugar maravilhoso chega ao fim... Voltamos pela estrada asfaltada (ufa), demos uma passadinha em Torres, lavamos o carro e visitamos uma velha amiga. Logo partimos para casa, dando uma parada em Garopaba: compramos os Long Johns (surf garantido no inverno!!!! Uhu!!!!!!) e fomos, aleluia, para casa. Chegando no apê, olha que surpresa bacana nos esperava na porta da entrada! Baratas! (Pelo menos estavam mortas). No dia seguinte limpamos tudo e aos poucos retomamos nossa rotina, ainda pensando em cada cachoeira, cada pousada e cada pessoa que conhecemos no nosso trajeto. Afinal, eu concordo que, para onde quer que vamos, levamos um pouco dos outros e deixamos um pouco de nós.